JudAnderson Fernandes Pereira — Teologia II

Por um ato de misericórdia Deus criou o universo e tudo que nele contém, e como uma obra prima dentre as criaturas visíveis, criou o homem à sua imagem e semelhança a fim de que este pudesse participar de sua própria Vida através da graça. Tragicamente o homem quebrou a aliança estabelecida com Deus, e por meio do primeiro pecado, todo gênero humano ficou privado de sua graça e estava condenado a não mais participar do fim para o qual Deus o havia criado. Que grave e duro castigo infligido pela Justiça Divina ao pecado cometido, entretanto, quão doce e suave solução encontrada pela Misericórdia Infinita do Criador, pois Ele enviou ao mundo o seu Filho Unigênito, a fim de redimir todo o gênero humano, e é por isso que a Igreja não hesita em cantar “O Felix Culpa, que há merecido a graça de um tão grande Redentor”.

1. Remédio contra o pecado           

            Tendo o homem sido infiel, perdeu o maior dos tesouros que lhe fora confiado: a graça de Deus; não só as portas do paraíso terrestre lhe foram fechadas, mas o Céu já não podia receber o homem fora do estado de graça. Qual o remédio contra este grande mal? Estaria o homem privado para sempre do fim sobrenatural para o qual fora criado?

            Com vistas a fazer com que o homem pudesse obter ou readquirir a graça perdida, Nosso Senhor Jesus Cristo opera a Redenção e deixa aos homens os sacramentos, que segundo a definição apresentada pelo Pe. Royo Marín são: “sinais sensíveis instituídos por Nosso Senhor Jesus Cristo para significar e produzir em nossas almas a graça santificante”. [1]

2. Necessidade dos sacramentos

            Conforme ensina o doutor angélico, não é real defender que Deus teria uma necessidade absoluta de instituir os sacramentos, pois poderia ter-Se utilizado de outras formas para que o homem pudesse alcançar a salvação eterna, entretanto, pode-se afirmar que foi sumamente conveniente a instituição dos mesmos, considerando a natureza humana em si mesma, o estado em que se encontrava o homem e pelo fato da ação humana desenvolver-se predominantemente no âmbito da realidade corporal.[2]

3. Os Sacramentos da antiga Lei

            Tendo sido fechadas as portas do Céu, os homens necessitavam de um Redentor que lhes traria novamente a possibilidade da salvação, contudo, a Divina Providência e a Misericórdia de Deus, demonstrada tantas vezes na história, parecem exigir que não se deixasse sem nenhum meio de salvação, mesmo antes da vinda do Redentor, tanto as crianças que morressem antes do uso da razão, quanto os adultos, a fim de que obtivessem o perdão de seus pecados atuais;[3] o padre Royo Marín assiná-la a existência de três destes sacramentos, apesar de não se saber bem o número deles:

O remédio da natureza(remedium naturae), que se ordenava a apagar o pecado original. Não se sabe em que consistia, mas parece que se tratava de alguma manifestação externa da fé no futuro Messias […];

A circuncisão promulgada por Deus a Abraão e sancionada novamente pela Lei de Moisés;

Uma espécie de penitência para a remissão dos pecados atuais. Tiveram tal caráter os chamados sacrifícios pelo pecado e pelo delito, promulgados posteriormente de forma mais determinada pela Lei de Moisés.[4]

 

            Estes foram os sacramentos do período da Lei Natural, e que mais tarde foram complementados por Moisés, no período da Lei Escrita, período este em que se pode afirmar certamente ter havido verdadeiros sacramentos.

4. Os sacramentos do período da Lei Escrita

            Chama-se período da Lei Escrita, o período compreendido desde Moisés até Cristo. Além do remedium naturae, da circuncisão e de certos sacrifícios pelo pecado, acrescenta-se ainda durante este período a celebração do cordeiro pascal, que era uma pré-figura da Eucaristia e a consagração pela qual Aarão seus filhos e descendentes eram destinados ao sacerdócio, que por sua vez, era uma pré-figura do sacramento da Ordem.[5]

            Por fim, baseando-se na certeza de que nenhum homem pode salvar-se a não ser pela fé em Cristo, é que São Tomás demonstra a real necessidade dos sacramentos na antiga Lei:

 […] já antes da vinda de Cristo convinha que houvesse sinais sensíveis, pelos quais o homem professasse sua fé na vinda futura do Salvador. Tais sinais se chamam sacramentos. Destarte, fica claro que era necessário que fossem instituídos sacramentos antes do advento de Cristo.[6]

5. Para os que desejam a salvação

Finalmente, cumpre salientar a grande superioridade dos sacramentos da Nova Lei para os da Antiga, pois “não se pode dizer que os sacramentos da Antiga Lei causavam a graça por si mesmos, isto é por força própria”,[7] enquanto que “os sacramentos da Nova Lei causam a graça: por ordem de Deus, são utilizados para causar a graça nos homens”.[8] Portanto, é na consideração deste desejo de Deus em salvar a humanidade perdida pelo pecado, que o homem deve encher-se de confiança e procurar acercar-se cada vez mais dos sacramentos, verdadeiras maravilhas postas por Deus à disposição de todos aqueles que desejam a salvação. 


[1] MARÍN, Antônio Royo. Teologia Moral para Seglares. 5ª edição. BAC: Madrid, 1993. p. 8.

[2] Cf. S.T. III, Q. 61,1.

[3] Cf.MARÍN, Antônio Royo. Teologia Moral para Seglares. 5ª edição. BAC: Madrid, 1993. p.11.

[4] Idem. p. 12.

[5] Cf. Idem.

[6] S.T. III, q. 61, 3.

[7] S.T. III, q. 62, 6.

[8] S.T. III, q. 62, 1.