Iñigo Abbad – 1º Ano Teologia
“Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho” (Is 7, 14). Com estas palavras, Deus, pela boca do Isaias, oferecia um sinal para a casa de Davi. Certamente, Acaz, rei de Judá, ao ouvir aquilo que o profeta lhe dizia, não compreendeu que este oráculo se referia ao nascimento do Salvador. Entretanto, é provável que a causa maior de seu assombro se deva mais ao fato de escutar a aparente contradição que se encontra nestas palavras. Pois, com efeito, como pode uma mulher ser virgem e mãe ao mesmo tempo?
O que para os homens é impossível, para Deus é possível. Assim, quis Ele operar n’Aquela que havia de ser a Mãe do Verbo Encarnado um dos maiores milagres que houve e haverá em toda a história: unir em Maria, sua Filha Prediletíssima, a virgindade e a maternidade.
Denominada nos Evangelhos “a Mãe de Jesus” (Jo 2,1; 19, 25), Maria é aclamada, sob o impulso do Espírito, desde antes do nascimento de seu Filho, como a “Mãe de meu Senhor” (Lc 1, 43). Ora, Aquele que Ela concebeu do Espírito Santo como homem e que se tornou verdadeiramente seu Filho segundo a carne não é outro que o Filho eterno do Pai, a segunda Pessoa da Santíssima Trindade. A Igreja confessa que Maria é verdadeiramente Mãe de Deus (Theotókos).
No entanto, para perplexidade da inteligência humana, embora sendo Mãe de Deus, se manteve virgem antes, durante e depois do parto. De fato, como nos ensina a doutrina católica, desde as primeiras formulações da fé, a Igreja confessou que Jesus foi concebido exclusivamente pelo poder do Espírito Santo no seio da Virgem Maria, afirmando também o aspecto corporal deste evento: Jesus foi concebido “do Espírito Santo, sem concurso de varão”. Os Padres da Igreja veem na conceição virginal o sinal de que foi verdadeiramente o Filho de Deus que veio numa humanidade como a nossa.
Assim, Santo Inácio de Antioquia, já no início do século II, afirmava: “Estais firmemente convencidos acerca de Nosso Senhor, que é verdadeiramente da raça de Davi segundo a carne, Filho de Deus segundo a vontade e o poder de Deus, verdadeiramente nascido de uma virgem”.
Os relatos evangélicos entendem a conceição virginal como uma obra divina que ultrapassa toda compreensão e toda possibilidade humanas. “O que foi gerado nela vem do Espírito Santo”, diz o Anjo a José sobre Maria (Mt 1, 20). A Igreja reconhece neste trecho do Evangelho o cumprimento da promessa divina dada pelo profeta Isaias: “a virgem conceberá…”
O aprofundamento de sua fé na maternidade virginal levou a Igreja a confessar a virgindade real e perpétua de Maria, mesmo no parto do Filho de Deus feito homem. Com efeito, o nascimento de Cristo “não lhe diminuiu, mas sagrou a integridade virginal” de Maria . A Liturgia da Igreja celebra Maria como a “Aeiparthenos”, ou seja, “sempre virgem”.
O olhar da fé pode descobrir, tendo em mente o conjunto da Revelação, as razões misteriosas pelas quais Deus, em seu desígnio salvífico, quis que seu Filho nascesse de uma virgem. Essas razões tocam tanto a pessoa e a missão redentora de Cristo quanto o acolhimento desta missão por Maria em favor de todos os homens.
A virgindade de Maria manifesta a iniciativa absoluta de Deus na Encarnação. Jesus tem um só Pai: Deus. “A natureza humana que Ele assumiu nunca o afastou do Pai […]. Por natureza, Filho de seu Pai, segundo a divindade; por natureza, Filho de sua Mãe, segundo a humanidade; mas propriamente Filho de Deus em suas duas naturezas”.
Jesus é concebido pelo poder do Espírito Santo no seio da Virgem Maria, pois Ele é o novo Adão que inaugura a nova criação: “O primeiro homem, tirado da terra, é terrestre; o segundo homem vem do Céu (1Cor 15, 47)”. A humanidade de Cristo é, desde a sua concepção, repleta do Espírito Santo.
Deste modo, Jesus, o Novo Adão, inaugura por sua concepção virginal o novo nascimento dos filhos de adoção no Espírito Santo pela fé. A participação na vida divina não vem “do sangue, nem de uma vontade da carne, nem de uma vontade de homem, mas de Deus” (Jo 1, 13). O acolhimento desta vida é virginal, pois esta é totalmente dada pelo Espírito ao homem. O sentido esponsal da vocação humana em relação a Deus é realizado perfeitamente na maternidade virginal de Maria.
Maria é virgem porque sua virgindade é o sinal de sua fé e de sua doação sem reservas à vontade de Deus. É sua fé que lhe concedeu tornar-se a Mãe do Salvador: “Maria é mais bem-aventurada recebendo a fé de Cristo do que concebendo a carne de Cristo”.
Maria é ao mesmo tempo Virgem e Mãe por ser a figura e a mais perfeita realização da Igreja. “A Igreja […] torna-se também ela Mãe por meio da palavra de Deus, que ela recebe na fé, pois pela pregação e pelo Batismo ela gera para a vida nova e imortal os filhos concebidos do Espírito Santo e nascidos de Deus. Ela é também a virgem que guarda, íntegra e puramente, a fé dada a seu Esposo”.
A respeito da Virgem Mãe, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira diz que não há título maior que o de Mãe de Deus. Contudo, “Nosso Senhor Jesus Cristo preza tanto a virgindade que desejou fosse sua Mãe também virgem, operando em favor d’Ela um estupendo milagre que excede à nossa imaginação: Maria permaneceu virgem antes, durante e depois do parto.
“Segundo a bela comparação que fazem os teólogos, assim como Nosso Senhor saiu do sepulcro sem esforço e sem nada quebrantar, assim deixou Ele o claustro materno, sem detrimento da virgindade de Maria Santíssima”.
O Doutor Melífluo, São Bernardo, viu nesta extraordinária ação da Providência, isto é, ser Maria Virgem e Mãe ao mesmo tempo, um dos privilégios que mais distingue a virgem Santíssima de todas as outras criaturas:
“Não há coisa, na verdade, que mais me deleite, porém tampouco há que mais me atemorize, que o falar da glória da Virgem Mãe. Confesso minha imperícia, não oculto minha grande pusilanimidade. Porque […] se me ponho a louvar sua virgindade, descubro que muitas outras foram, depois d’Ela, virgens. Se me ponho a exaltar sua humildade, encontrar-se-ão talvez muito poucos, mas se acharão, que, a exemplo de seu Divino Filho, se fizeram mansos e humildes de coração. Se engrandeço a multidão de suas misericórdias, vêm-me à lembrança alguns homens e também mulheres que foram misericordiosos. Mas uma coisa há na qual Ela não teve antes par nem semelhante, nem o terá jamais, e foi em unir as alegrias da maternidade com a honra da virgindade. Ninguém duvida, com efeito, que se é boa a fecundidade conjugal, todavia é melhor a castidade virginal; pois bem, supera imensamente às duas a fecundidade virginal ou a virgindade fecunda. Privilégio é este próprio de Maria e que não se concederá jamais a nenhuma outra mulher. […] É prerrogativa singular d’Ela e por isto mesmo inefável: ninguém poderá compreendê-la, nem explicá-la.
“Que, dizer, então, se nos lembrarmos de quem Maria se tornou Mãe? Que língua, fosse mesmo angélica, seria jamais capaz de louvar bastante a Virgem Mãe? Mãe, não de um qualquer, mas de Deus. Duplo milagre, duplo privilégio, que de modo maravilhoso se harmonizam. Porque nem era digno da Virgem outro Filho, nem de Deus, outra Mãe”.
Semelhante é o pensamento de São Tomás de Aquino, ao comentar este versículo do Magníficat: “Porque em Mim fez grandes coisas o que é poderoso, e cujo nome é santo” (Lc 1, 49). “Que grandes coisas Vos fez?” — pergunta São Tomás — “Creio que [estas]: sendo criatura, daríeis à luz o Criador, e que sendo escrava, engendraríeis o Senhor, para que Deus redimisse o mundo por Vós, e por Vós também lhe devolvesse a vida. E sois grande, porque concebestes permanecendo virgem, superando por disposição divina, à natureza. Fostes reputada digna de ser mãe sem obra de varão; e não uma mãe qualquer, mas a do Unigênito Salvador.
“Diz, pois: ‘O que é poderoso’, para que se alguém duvide da verdade da Encarnação, permanecendo virgem depois de haver concebido, refere este milagre ao grande poder d’Aquele que o fez”.
Por outro lado, considerando o extraordinário fato de Maria conciliar em si a perpétua virgindade e a maternidade divina, exclama um piedoso autor do século passado:
“Ó Maria, Virgem Mãe, sois doravante um ideal que arrebatará todos os amantes da verdadeira beleza: Virgem Mãe, os doutores e os artistas tomar-vos-ão à porfia por tema de suas mais sublimes composições, e todos, após cansarem o próprio gênio, deporão a pena ou o pincel, sem ter podido exprimir tudo o que solicitava os ardores de seu anelo e os entusiasmos de seus sentimentos!”.
Difícil será abarcar num artigo todos os belos comentários que, no decorrer da História, estes e aqueles santos, místicos e teólogos fizeram a respeito deste maravilhoso milagre que Deus operou na Virgem Mãe. De fato, Dr. Plinio Corrêa de Oliveira comentava que este mistério na vida de Maria santíssima só era possível numa,“alma de uma imensidade inefável, alma na qual todas as formas de virtude e de beleza existem com uma perfeição supereminente, da qual nenhum de nós pode ter uma ideia exata. […] [Ela reúne] numa perfeita harmonia contrastes aparentemente irreconciliáveis: é a Virgem Mãe, chamada a Virgem das Virgens, que poderia, muito lícita e validamente, também ser chamada a Mãe das Mães. Ninguém mais plenamente Mãe, Mãe por excelência, do que Ela. Ninguém mais plenamente Virgem, Virgem por excelência, do que Ela também”.
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