A maternidade divina de Maria traz consigo uma consequência lógica irrefutável: Ela é também nossa Mãe e a Mãe da Igreja.
Sim! Tal como declara o Apóstolo, a Igreja é o Corpo Místico de Cristo. Este Corpo é constituído por todos os batizados e tem a Cristo como Cabeça, do qual deflui toda a vida sobrenatural para seus membros.[1] Sendo, pois, Mãe da Cabeça, Ela é consequentemente também Mãe do Corpo.
Porém, há ainda outro título que justifica esta maternidade: Maria “é verdadeiramente Mãe dos membros que constituem este Corpo, porque cooperou com o seu amor para que na Igreja nascessem os fiéis, membros daquela Cabeça”.[2]
Assim, pois, naquele momento, feliz entre todos, da Encarnação, Maria passou a ser verdadeiramente Mãe de Deus e dos homens:
“Concebeu-nos em Nazaré e nos deu à luz no Calvário. ‘Com o seu consentimento para tornar-se Mãe de Deus, escreve São Bernardino de Siena, trouxe a salvação e a vida eterna a todos os eleitos, de sorte que se pode dizer que, naquele instante, os acolheu em seu seio, conjuntamente com o Filho de Deus’.”[3]
Como vemos, Maria nos “deu à luz” no Calvário, e é nossa Mãe também por ter sido Corredentora do gênero humano, pois foi através da Paixão de seu Filho, à qual Ela deu seu assentimento, que recomeçou para a humanidade a vida sobrenatural perdida no paraíso.
Com estas belas palavras, Dr. Plínio assim comenta a insigne participação de Maria na Obra da Redenção:
“Quando estava ao pé da Cruz, o Padre Eterno pediu-Lhe consentimento para que Nosso Senhor Jesus Cristo fosse morto. Ela, que poderia ter dito não — o Padre Eterno estava querendo pôr nas mãos d’Ela o destino de seu Filho — disse sim. Disse sim para salvar as almas dos homens. Se Ele não morresse, não haveria Céu para nós.
Nessa hora em que Ela disse sim, Ele ficou entregue aos horrores da morte. Ela viu Seu Filho dizer ao Padre Eterno: ‘Meu Pai, meu Pai, por que me abandonastes?’ O que tinha um pouco o sentido: ‘Minha Mãe, minha Mãe, por que consentistes?’ Mas Ela quis. E quando Ele expirou, o gênero humano estava redimido.”[4]
É também o que proclama o Vaticano II com sua característica linguagem e autoridade conciliar:
“Concebendo, gerando e alimentando a Cristo, apresentando-O ao Pai no Templo, padecendo com Ele quando agonizava na Cruz, cooperou de modo singular, com a sua fé, esperança e ardente caridade, na obra do Salvador, para restaurar nas almas a vida sobrenatural. É por esta razão nossa Mãe na ordem da graça.”[5]
São Bernardo, o Doutor Melífluo, não deixa de exalar um preciso e piedoso pensamento sobre o assunto:
“Pior que a espada, transpassando a alma, não foi aquela palavra que atingiu até a divisão entre a alma e o espírito: Mulher, eis aí o teu filho? (Jo 19,26). Oh! Que troca incrível! Mãe, João te é entregue em vez de Jesus, o servo no lugar do Senhor, o discípulo pelo Mestre, o filho de Zebedeu pelo Filho de Deus, o puro homem em vez do Deus verdadeiro. Como ouvir isso deixaria de transpassar tua alma tão afetuosa, se até a lembrança nos corta os corações, tão de pedra, tão de ferro?”[6]
Em suma, ao mesmo tempo em que Cristo operava a redenção da humanidade, nascia a Santa Igreja de seu costado aberto. Quando o soldado Longinus abriu com sua lança o costado do Salvador, Jesus já havia expirado. Mas, aos pés da Cruz stabat Mater Dolorosa. Ela sentiu em seu próprio coração a dor da lança que perfurava o Sagrado Coração, sentiu em si aquela dor que seu Filho Divino não mais podia sentir. Tendo a Igreja nascido do flanco de Cristo golpeado, bem se pode afirmar que foi Maria quem sofreu as dores deste “parto” no seu próprio Imaculado Coração. Esta dor apenas Ela a sofreu, pois Jesus já estava morto. Por que negar que Ela, assim, participava também do nascimento da Igreja como Mãe terníssima? Ela é, verdadeiramente, a Mater Ecclesiae.
Felipe Rodrigues de Souza
Trecho extraído da monografia: “Maria Santíssima: o Paraíso de Nosso Senhor Jesus Cristo, na reflexão mariológica de Plinio Correa de Oliveira”.
[1] Cf. Ef 1, 22-23; 1Cor 6, 15a; Rom 6, 4-6; Col 1, 18.
[2] Cf. AGOSTINHO, San. De S. Virginitate, 6: PL 40, 399. In: PONS, Guillermo. Textos marianos de los primeros siglos. Madrid: Ciudad Nueva, 1994. p. 127.
[3] ROSCHINI, Pe. Gabriel. Instruções Marianas. São Paulo: Paulinas, 1960. p. 78-79.
[4] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Conferência para jovens. 21 out. 1989. Arquivo ITTA.
As matérias extraídas de exposições verbais – designadas neste trabalho, segundo sua índole, como “conferências”, “palestras”, “conversas” ou “homilias” – foram adaptadas para a linguagem escrita.
[5] VATICANO II. Const. dogm. Lumen gentium, 61: AAS 57 (1965) 63.
[6] BERNARDO, São. Liturgia das Horas. São Paulo: Vozes/Paulinas/Paulus/Ave Maria, 1999. Vol. IV, p. 1281-1282.
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