Juliane Campos

Conta-nos o historiador Eusébio de Cesaréia que o general Constantino, filho de Santa Helena, no ano de 312, na noite anterior à batalha em que derrotaria o imperador Maxêncio — terrível perseguidor dos cristãos — teve um sonho no qual viu uma cruz luminosa no ar, enquanto ouvia uma voz lhe dizer: “Com este sinal vencerás!” No dia seguinte, antes de começar a difícil peleja, mandou colocar o símbolo da cruz nas bandeiras de suas legiões e partiu para a batalha, na qual obteve vitória total. 
Um fruto imediato desse episódio foi a liberdade de culto para os cristãos, até então perseguidos pelos pagãos, concedida pelo próprio Constantino, ao ser coroado imperador.
Todavia, pode-se dizer que aquela promessa, apresentada em sonho, era dirigida, de modo mais amplo, a cada católico que, na luta da vida, combate sob o signo da cruz.
Caro leitor, convido-o hoje a exaltar o símbolo máximo da Cristandade, cuja festa celebramos no dia 14 deste mês: a Santa Cruz!Stanze_Vaticane_-_Raffaello_-_Apparizione_della_croce

De sinal de ignomínia a sinal de glória

Já de início, alguém poderia nos perguntar: “Mas se a Igreja Católica é a religião da vida, porque glorificar esse instrumento de morte?”
Diz São Paulo: “Nós pregamos a Cristo crucificado, escândalo para os judeus, loucura para os pagãos; mas para os eleitos — quer judeus quer gregos —, força de Deus, e sabedoria de Deus. Pois a loucura de Deus é mais sábia do que os homens, e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens” (1 Cor 1,23-25).
No alto da cruz, na aparente derrota, no aparente fracasso, escândalo e loucura, Jesus nos libertou da morte e do pecado. No alto deste madeiro, reservado aos criminosos mais perversos, Cristo venceu o demônio e nos abriu as portas do céu. Por isso, a cruz é para nós o luzeiro que nos indica o caminho, nesta terra de exílio, rumo à Jerusalém Celeste: “Se alguém quer vir após mim, renegue-se a si mesmo, tome cada dia a sua cruz e siga-me” (Lc 9,23).
De sinal de ignomínia, a cruz passou a ser sinal de glória, para os homens de fé. E assim como Constantino a colocou em seus estandartes, a cruz passou a figurar em todos os lugares onde há um batizado, desde o báculo dos Papas ou a coroa dos reis, até mesmo a parede de uma humilde casa de aldeia.

O demônio foge da cruz

O demônio foge deste sinal de sua derrota e de nossa libertação.
Sucedeu a Santo Antônio Abade, no séc. II, que o demônio o atormentava com terríveis tentações. Um dia, angustiado por tantos ataques, ocorreu-lhe fazer o sinal da Cruz e o demônio se afastou. Daí em diante, cada vez que esse infame o perturbava, o santo fazia novamente o sinal da cruz, diante do qual o demônio sempre fugia.

A verdadeira Cruz

Uma simpática e antiga tradição, não confirmada pelos estudiosos do assunto, narra como Santa Helena, no séc. IV, encontrou em Jerusalém a verdadeira Cruz de Jesus. Segundo São Cirilo de Jerusalém, Santo Ambrósio e Rufino, depois de muitas e profundas escavações, os exploradores encontraram três cruzes, porém não sabiam distinguir qual seria a de Nosso Senhor. Levaram, então, para o local, uma mulher agonizante e nela tocaram cada uma das três cruzes. Ao tocá-la com a terceira cruz, a doente recuperou instantaneamente a saúde e se levantou. Vendo esse milagre, Santa Helena, juntamente com São Macário, bispo de Jerusalém, e milhares de fiéis, saíram em procissão pelas ruas, portando consigo o adorável instrumento da nossa Redenção. No caminho, encontraram-se com uma viúva que levava seu filho morto para ser enterrado. Aproximaram do defunto a Santa Cruz e ele ressuscitou.

A festa da Exaltação da Santa Cruz

No séc. VII, o Império Bizantino (sucessor do Império Romano do Oriente) travava uma guerra interminável com os Persas. Estes conquistaram a Palestina em 614, apossando-se de tesouros e da relíquia da Santa Cruz. Somente a 14 de setembro de 627 o imperador Heráclio, havendo invadido a Pérsia, a recuperou, passando esta data a ser celebrada por toda a cristandade como a festa da Exaltação da Santa Cruz. Para evitar novos roubos, a Cruz foi dividida em vários pedaços. Um deles foi levado a Roma, outro a Constantinopla e um terceiro ficou num belo cofre de prata em Jerusalém. Outro foi dividido em pequeníssimos fragmentos, enviados a igrejas do mundo inteiro. Hoje em dia, em Roma, encontra-se na Igreja da Santa Crocce (Santa Cruz) o maior fragmento existente da verdadeira Cruz de Jesus, bem como outras relíquias da Paixão.

“Per crucem, ad lucem”

São grandes as dificuldades a enfrentar e duros os caminhos a percorrer nesta terra, principalmente em nossos dias, nos quais a sociedade é abalada por tantos males e ameaças. “A vida do homem sobre a terra é uma luta!” (Jó 7, 1). O que importa é não nos deixarmos abater, como Nosso Senhor não se deixou desanimar. Mesmo tendo caído três vezes no caminho do Calvário, Ele levantou-Se e chegou até o fim da sua Via Crucis. 
Com razão ensinou o Papa João Paulo II, quando esteve entre nós, no Brasil, aos pés do Cristo Redentor:”A cruz, símbolo da fé, é também símbolo do sofrimento que conduz à glória, da paixão que conduz à Ressurreição. ‘Per crucem ad lucem’, pela cruz, chega-se à luz: este provérbio, profundamente evangélico, nos diz que, vivida em seu verdadeiro significado, a cruz do cristão é sempre uma cruz pascal” (Hom. Rio de Janeiro, 30/6/1980).