Michel Six – 3º Ano Teologia
Dentre seus diversos dons, São João Maria Vianney era também diretor espiritual. Dotado de um profundo discernimento dos espíritos sabia ele como “dar a volta” nas consciências mais endurecidas. Deste aspecto de direção espiritual, diz-nos o Catecismo da Igreja Católica (n. 2690): “O Espírito Santo dá a certos fiéis dons de sabedoria, de fé e de discernimento em vista do bem comum que é a oração (direção espiritual). Aqueles e aquelas que têm esses dons são verdadeiros servidores da tradição viva da oração”. Bem nos ilustra este caso de um pobre penitente impregnado pelo espírito de sua época:
Certo dia, o Cura de Ars vê entrar em sua sacristia um personagem elegante que, aproximando-se dele, se apressa em dizer:
“Senhor padre, não venho de modo algum me confessar. Vim para argumentar convosco.
– Ah! meu caro amigo, vós vos expressais bem mal, responde o Senhor Vianney, eu não sei argumentar… Mas se vós precisais de alguma consolação, coloque-se ali…”
E o Cura de Ars designa o lugar onde habitualmente se ajoelham seus penitentes, acrescentando: “Credes que muitos outros se ajoelharam antes de vós e não se arrependeram…
-Mas, senhor padre, já tive a honra de vos dizer que não vim para me confessar, e isto por uma razão que me parece simples e decisiva. E é que eu não tenho fé. Assim como não acredito na confissão, não acredito em tudo o resto.
– Meu amigo, vós não tendes fé? Ah! como eu vos lastimo! Uma criancinha de oito anos sabe, com seu catecismo, mais do que vós. Eu me julgava bem ignorante, mas vós sois ainda mais do que eu, pois que vós ignorais as primeiras coisas que é preciso saber…”
O padre Vianney continua a falar – e volta à sua ordem inflexível e doce:
“Coloque-se ali, e eu vou ouvir a vossa confissão.
– Senhor padre, responde o outro que começa a perder sua convicção, é uma comédia que vós me aconselhais a representar convosco! Peço-vos que considere que eu não vejo nenhuma graça. Não sou comediante…
– Coloque-se ali, estou dizendo!”
E o interlocutor se encontra de joelhos “sem desconfiar e quase apesar de si – mesmo”. Ele se levantará alguns instantes mais tarde, não somente consolado, mas “perfeitamente crente” – tendo tomado, para ir à fé, um caminho curto e fulminante.[1]
Como o definiu o próprio santo de Ars: “Os que são conduzidos pelo Espírito Santo têm idéias certas. Eis porque há tantos ignorantes que sabem mais do que os sábios”.
Enfim, eis alguns traços de uma inteligência brilhante, pois posta em Deus, de um que se deixou levar pelo Espírito Santo, sem opor resistência. Mesmo se sua natureza não lhe ajudou, soube este santo, sendo fiel às graças, abeberar-se no manancial da Sabedoria Eterna. Muito nos ensina, sobre a sabedoria, o grande Cornélio a Lápide, retomando São Paulo:
Escutai são Paulo escrevendo aos Coríntios: “Para mim, meus irmãos, quando vim vos anunciar o testemunho do Cristo, não vim na sublimidade dos discursos da sabedoria; pois não quis saber de outra coisa entre vós do que de Jesus Cristo, e de Jesus Cristo crucificado” […]. Aquele que o mundo cristão chama de grande Apóstolo merece certamente ser ouvido quando nos ensina em que consiste a verdadeira sabedoria; ora, ele a emprega toda inteira em conhecer a Jesus Cristo, e Jesus Cristo crucificado… A ciência de Jesus Cristo e de sua cruz, eis a verdadeira sabedoria, e toda a sabedoria […].
Aprender a sabedoria, é aprender a conhecer, a amar, a servir a Deus, a tender ao fim para o qual o homem foi criado e resgatado…
A verdadeira sabedoria consiste em conhecer a Jesus Cristo, e o que ele faz por nós… Ela consiste em conhecer a lei de Deus, a religião, a praticá-la; a praticar a virtude, a fugir do vício. Aí está toda a sabedoria…; fora disto está a loucura… (tradução minha) [2].
Enfim, podemos concluir, com o catecismo que, belamente, nos ensina:
A Sabedoria é um eflúvio do poder de Deus, emanação puríssima da glória do Todo-Poderoso; por isso nada de impuro pode nela insinuar-se. É reflexo da luz eterna, espelho nítido da atividade de Deus e imagem de sua bondade (Sb 7,25-26). A sabedoria é mais bela que o sol, supera todas as constelações. Comparada à luz do dia, sai ganhando, pois a luz cede lugar à noite, ao passo que, sobre a Sabedoria o mal não prevalece (Sb 7,29-30). Enamorei-me de sua formosura (Sb 8,2). (2500).
[1]Cf. SAINT PIERRE, 1963, p. 254-256.
[2] Écoutez saint Paul écrivant aux Corinthiens : “Pour moi, mes frères, lorsque je suis venu vous annoncer le témoignage du Christ, je ne suis point venu dans la sublimité des discours de la sagesse ; car je n’ai voulu savoir parmi vous autre chose que J.C., et J.C. crucifié” […]. Celui que le monde chrétien appelle le grand Apôtre mérite assurément d’être écouté lorsqu’il nous enseigne en quoi consiste la vraie sagesse ; or, il la place tout entière à connaître J.C., et J.C. crucifié… La science de J.C. et de sa croix, voilà donc la vraie sagesse et toute la sagesse […]. Apprendre la sagesse, c’est apprendre à connaître, à aimer, à servir Dieu, à tendre à la fin pour laquelle l’homme est créé et racheté… La vraie sagesse consiste à connaître J.C., et ce qu’il fait pour nous… Elle consiste à connaître la loi de Dieu, la religion, à la pratiquer ; à pratiquer la vertu, à fuir le vice. Là est toute la sagesse…; hors de là est folie… BARBIER, 1885, p.329 e 331.
BIBLIOGRAFIA
– CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. 11ª ed. São Paulo: Loyola, 2001.
– BARBIER. Les Trésors de Cornelius a Lapide. 5ª ed. Paris : Librairie Poussielgue Frères, 1885.
-SAINT PIERRE, Michel de. La vie prodigieuse du Curé d’Ars. Paris : Éditions Bonne Presse, 1963.
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