Mons. João Scognamiglio Clá Dias

Homilia no Seminário Thabor, Caieiras-SP, dia 5 de junho de 2008

Hoje vemos esse mestre da lei diante de Nosso Senhor perguntando sobre o maior dos Mandamentos, depois de ter havido o episódio em que os saduceus perguntaram sobre a esposa de sete maridos…  E este mestre da lei, certamente fariseu, ficou encantado com Jesus por ter visto pela primeira vez uma discussão na qual os saduceus ficavam com os lábios presos e amarrados, não conseguindo sair com outro argumento depois do que Nosso Senhor disse, além do mais, os fariseus e saduceus estavam em constante desacordo.

Não sabemos se ele faz isso com desejo de mostrar que também conhecia a Escritura, mostrar estar à altura de Nosso Senhor Jesus Cristo, ou se ele está admirado mesmo. Era evidente que o fariseu sabia perfeitamente qual era o principal dos mandamentos.

Jesus viu que ele tinha respondido com inteligência e disse:

34 “Tu não estás longe do reino de Deus”.

Se ele conhecia todas estas coisas, por que Nosso Senhor Jesus Cristo terá dito “Tu não estás longe do reino de Deus”? O que lhe falta? A pergunta e o diálogo se estabelecem em função de um tema fundamental: o primeiro e mais importante mandamento da Lei de Deus.

Devemos antes de tudo considerar que este mandamento tem dois comprimentos de onda: há uma verticalidade do amor a Deus e a horizontalidade do amor a Deus. O amor ao próximo é o amor a Deus, é o amor a Deus desdobrado horizontalmente. Eu amo a Deus diretamente e amo a Deus no próximo. Essa horizontalidade e verticalidade formam a Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo… Ele morreu por amor ao Pai celeste e por amor a nós. Amor a nós em função do Pai, que é o amor a Ele mesmo.

Por isso o Evangelho de hoje tem um brilho especial. São Tomás, sabendo ressaltar bem esse brilho, diz que a Fé é praticamente um complemento da inteligência. Ela se acopla à inteligência e não há dicotomia entre ambas. A inteligência dá sustentação a uma série de princípios da Fé e esta, com o auxílio da inteligência, a faz voar como um voo de águia.

O Fariseu recebe o elogio de que ele respondeu com inteligência. As palavras de Nosso Senhor são pesadas, contadas, medidas, e bem objetivas. Elas têm um significado preciso. Ele respondeu com inteligência, não respondeu com amor. Nosso Senhor Jesus Cristo também não disse: “respondeu com muito sentimento; respondeu com charme; respondeu com grandeza; respondeu com fogo, com entusiasmo”. Não. Ele disse: “respondeu com inteligência”.

E, no entanto, a inteligência com que este homem responde não o coloca dentro do Reino de Deus, pois Nosso Senhor afirma: “Tu não estás longe do reino de Deus”.

O que é que põe a pessoa dentro do Reino de Deus? É a inteligência? Não. É a Caridade, o amor.

São Tomás nos explica claramente a respeito desta temática – como tivemos possibilidade de estudar no curso de filosofia com estes jovens do seminário –: a inteligência e a vontade tem movimentos contrários no que diz respeito à compreensão e à apreensão. A vontade “voa” até o objeto amado; a inteligência faz com que o objeto amado “voe” até a pessoa. Por isso a própria Fé posta na inteligência é importante, porque sem ela não se ama. Por conseguinte, ela é a porta para que se possa praticar o amor.

Mas quando se trata de comparar, as três virtudes teologais, com São Paulo, não hesitamos em dizer: a Caridade é a mais importante.

São Tomás explica: quando eu entendo algo – por exemplo, uma joaninha – faço com que ela “voe” até mim. Portanto, se algo é inferior a mim eu dou mais valor àquilo que eu estou entendendo, dou mais valor do ele tem em si. Na minha inteligência a joaninha vai se tornar enriquecida porque eu a fiz “voar” até a minha inteligência, e nela se enriqueceu. Porque eu comecei a ver todas as relações que existe entre ela e Deus, comecei a me dar conta de como ela é um inseto muito bem estruturado, com muito engenho, com muita sabedoria da parte de Deus. Então ela se enriqueceu em mim.

Se se trata de um objeto maior do que eu, vamos supor, o Papa, eu ao entendê-lo na minha inteligência ele fica diminuído. Portanto, entender algo que é superior a mim eu diminuo esse objeto para poder caber na minha inteligência.

Por isso São Tomás diz que a vontade deve fazer o caminho contrário. Ela não toma o objeto e faz “voar” para si, mas “voa” até o objeto e ama o objeto na proporção daquilo que ele é.

Tratando-se de uma joaninha minha vontade fica diminuída. Tratando-se de um Papa minha vontade fica aumentada. Se se trata de Nossa Senhora minha vontade aumenta mais ainda. Mas, quando o objeto é o próprio de Deus ela toma uma perspectiva extraordinária. E por isso os grandes homens, os homens capazes de grandes heroísmos são aqueles que amam a Deus verdadeiramente…

Ora, este mestre da lei está próximo, não está longe. Falta a ele, uma vez que entendeu, amar. Se ele não amar, apenas fica nas proximidades. Para estar dentro do Reino de Deus é preciso a prática da virtude da Caridade. Sem a virtude da Caridade não entramos no Reino de Deus, mantemo-nos fora por mais próximos que possamos estar.

Esta Liturgia deixa bem claro isso: não basta conhecer. Mas, nós precisamos estudar? Sim. Por isso formamos este instituto. Todos terão de concluir seus estudos até a hora da morte…

Alguém dirá:

— Não, mas e o diploma?

O diploma é caminho para a morte. Uma vez adquirido o diploma temos que estudar o resto da vida. Fazer o mestrado, depois doutorado. Tudo!

Entretanto, mais importante que o estudo é amar a Deus e amá-Lo com toda a inteligência, como está dito aqui:

“Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e com toda a tua força”.

Isto é mais importante do que entender. Porém, não se ama aquilo que não se conhece: São duas asas que precisam estar bem ajustadas e bem desenvolvidas para alçarmos toda a espécie de “voos”.

Nada melhor do que um estudo feito em comunidade, dentro de um ritmo de vida religiosa, regada de orações. Se voarmos com uma asa só vamos lá para baixo.

Isso é o que pedimos tão claramente, tão insistentemente no Salmo Responsorial:

“Verdade e amor são os caminhos do Senhor…”

A liturgia é clara. Temos que adequar o nosso estudo à nossa vida. E esta tem que ser uma de santidade. Devemos praticar a virtude na melhor das perfeições. O decálogo para nós deve ser um corrimão, ou uma escada rolante: devemos subir nesses dez degraus dos mandamentos para que eles nos levem ao mais alto amor.

Ora, para isso necessitamos a Graça e a assistência de Nosso Senhor Jesus Cristo, como está dito na Primeira Leitura:

10 “Por isso suporto qualquer coisa pelos eleitos, para que eles também alcancem a salvação, que está em Cristo Jesus, com a glória eterna.

8 Lembra-te de Jesus Cristo e da descendência de Davi ressuscitado dentre os mortos segundo o meu Evangelho”.

Na Graça nós vamos encontrar o equilíbrio. Nela teremos os elementos necessários para entender e para amar.

Coloquemos, então, toda a nossa segurança em Nosso Senhor Jesus Cristo. Aí está a força de todo cristão!

Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!

Este texto foi extraído de uma gravação de áudio e adaptado à linguagem escrita, sem revisão do autor.

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