Podemos encontrar uma verdadeira estrela que despontou, resplandecendo no meio das trevas do paganismo e da escravidão! Bakhita nasceu no Sudão, região de Darfur na África, no ano de 1869, e através de suas poucas informações sabemos que sua aldeia natal é Olgossa, cuja pronúncia é “algoz”, que em árabe significa “Dunas de Areia”. De família abastada, seu pai possuía terras, plantações e gado; ele era irmão do chefe da aldeia. Sua família era composta pelos pais e sete filhos, sendo muito unidos e afeiçoados. Muito embora a descrição dessa aurora da Bakhita deixa entrever um céu límpido, não tardará em ser coberto por nuvens de tribulações, como veremos adiante.
Os dois gigantes opressores: “ O paganismo e a escravidão”
Sabemos que a verdadeira paz só se encontra em Deus. Embora a família da Bakhita tivesse uma conduta moralmente irrepreensível, de acordo com a lei natural, infelizmente os seus contemporâneos ainda não tinham sido beneficiados pelas benção da Igreja e da fé.
Vejamos o contexto histórico da época: em 1821 Mohamed Ali envia dois exércitos para conquistarem o Sudão. O objetivo político era de instaurar uma dinastia própria na região, e os objetivos práticos eram de saquear riquezas e capturar escravos a serem vendidos no mercado.
No ano de 1874, a irmã mais velha da Bakhita foi raptada. A dor dilacerou o coração daquela família tão unida e feliz. “Bakhita,” não foi o nome que recebera dos pais quando nasceu: no ano de 1876. Com mais ou menos 7 anos de idade, foi raptada e arrancada do seio de sua família. A pequena menina tomada de pavor, foi levada brutalmente por dois árabes e foram eles que impuseram o nome de “Bakhita”, que significa: “afortunada”.
A pequena escrava, depois de um mês de prisão, foi vendida a um mercador de escravos. Na ânsia de voltar para casa, Bakhita se arma de coragem e tenta fugir. Porém, foi capturada por um pastor e revendida a outro árabe, homem feroz e cruel, que, por sua vez, revendeu-a a outro mercador de escravos. Novamente ela é vendida a um general turco, cuja esposa era uma mulher terrivelmente má. Desejou marcar suas escravas e Bakhita estava entre elas. Chamou então um tatuador que, com uma navalha, ia marcando os corpos das meninas que se contorciam de dores, mergulhadas numa poça de sangue. Bakhita recebeu no peito, no ventre e nos braços 114 cortes de navalha que eram esfregados com sal para que as marcas ficassem bem abertas. As jovens escravas foram jogadas sem tratamento e nenhum cuidado, durante um mês.
No ano de 1882, o general turco vendeu Bakhita ao agente consular Calisto Legnani que seria, para ela, seu anjo bom. Na casa do cônsul, Bakhita conheceu a serenidade, o afeto e os momentos de alegria, lembranças dos momentos felizes na casa dos pais. Em 1885 o Sr. Calisto é obrigado a retornar à Itália; Bakhita pede para acompanhá-lo e obtêm consentimento. E assim partiram em companhia de um amigo, o Sr. Augusto Michieli, a quem o cônsul presentearia em Gênova com a jovem africana.
Chegando na Itália com seu 7º “patrão”, o rico comerciante Michieli, foi para vila Zianino de Mirano Veneto onde Bakhita se tornou babá de Mimina, a filhinha do casal. Apesar de serem pessoas boas e honestas, não eram praticantes da religião. Como sempre, Deus tem suas vias e acabou colocando no caminho de Bakhita, o administrador dos Michieli, Iluminato Chechini. Iluminato era um homem muito religioso e logo se preocupou com a formação religiosa de Bakhita; e ao dar um crucifixo a ela, disse em seu coração: “Jesus, eu a confio a Ti”. Quando os Michieli tiveram de voltar para Suakin, na África, por motivos de negócios, Bakhita e a pequena Mimina ficaram aos cuidados das Irmãs Canossianas, em Veneza, e isto graças ao Sr. Iluminato.
Bakhita iniciou o catecumenato (catequese para receber os sacramentos iniciais), no Instituto das Irmãs. Ao final de nove meses, a Sra. Maria Turina voltou à Itália para buscar sua filhinha Mimina e aquela que considerava sua escrava, pois retornariam à África. Naquele instante, Bakhita já toda apaixonada por Jesus, prestes a receber os sacramentos, recusa-se a voltar para a África, apesar do afeto que nutria pela família Michieli e principalmente pela pequena. Sentia em seu coração um desejo inexplicável de abraçar a fé e vivê-la para sempre. Apesar dos apelos e até ameaças da Sra. Michieli, nossa jovem africana não cedeu em sua resolução. Bakhita estava livre, na Itália não havia escravidão. Sua patroa retornou à África com sua filha e Bakhita prosseguiu com sua catequese, feliz mesmo sabendo que seria a última chance de rever seus familiares na África.
No dia 09 de janeiro de 1890, Bakhita é batizada, crismada e recebe a Primeira Comunhão das mãos do Patriarca de Veneza. No batismo recebe o nome de Josefina Margarida Bakhita. Ela descreverá este dia como mais feliz de sua vida: sentir-se filha de Deus era-lhe uma emoção inigualável, assim como receber Jesus na Eucaristia. Bakhita nutria em seu coração o sublime desejo de se tornar religiosa: “uma Irmã Canossiana”. Foi então aceita na congregação das Filhas da Caridade Canossianas, servas dos pobres e, depois de três anos de noviciado, no dia 08 de dezembro de 1896 pronunciou os votos de: Castidade Pobreza e Obediência. Depois da profissão religiosa, nossa Irmã Bakhita foi transferida para a cidade de Schio, em outra obra da Congregação, e lá permaneceu por 45 anos, onde passou a ser conhecida como a “Madre Morena”. Irmã Bakhita era atenciosa com todos, sem distinção, desde as crianças do colégio, seus pais, sacerdotes, com suas irmãs religiosas, sempre levando a todos palavras de conforto, consolo e amor incondicional a Deus Pai. Em todas as funções que exerceu, sempre colocou seu coração doce e sincero: na Igreja, na Sacristia, na portaria ou na cozinha, era tudo para todos, com seu sorriso de anjo.
Irmã Bakhita, em sua infância na África, mesmo sem saber nada de Deus, pensava em seu coração inocente e puro, quando olhava a lua e as estrelas: “Quem será o patrão de todas estas coisas?”. Oh! Bakhita, Deus já estava te preparando para Ele! Bakhita sonhava com a conversão do povo africano e, no dia de sua profissão religiosa, rezou: “Ó Senhor, se eu pudesse voar lá longe, entre a minha gente e proclamar a todos, em voz alta, a tua bondade. Oh! Quantas almas eu poderia conquistar para Ti! Entre os primeiros, a minha mãe e o meu pai, os meus irmãos, a minha irmã ainda escrava… e todos, todos os pobres negros da África. Faça, ó Jesus, que também eles te conheçam e te amem!”.
No ano de 1947 Bakhita adoeceu, já quase sem forças, em cadeira de rodas, passava horas em oração, em adoração e contemplação. Era o dia 08 de fevereiro de 1947, nossa Irmã Morena balbuciava: “Como estou contente! Nossa Senhora! Nossa Senhora!”. Depois de algum tempo, em seus últimos momentos, disse: “Vou devagarinho para a eternidade… Vou com duas malas: uma contém os meus pecados; a outra, bem mais pesada, contém os méritos infinitos de Jesus Cristo. Quando eu comparecer diante do Tribunal de Deus, cobrirei a minha mala feia com os méritos de Nossa Senhora. Depois abrirei a outra e apresentarei os méritos de Jesus Cristo. Direi ao Pai: ‘Agora julgai o que vedes’. Estou segura de que não serei rejeitada! Então me voltarei para São Pedro e lhe direi: ‘Pode fechar a porta porque eu fico!” Às 20 horas, irmã Bakhita entrega sua alma a Deus. O povo em grande multidão quer dar o último adeus à Madre Morena, sua fama de santidade se espalhou rapidamente e todos recorriam ao seu túmulo pedindo sua intercessão. Em 17 de maio de 1992 foi beatificada e, no dia 1 de outubro de 2000, foi elevada à honra dos altares, declarada “Santa” pelo Santo Padre, o Papa João Paulo II, sendo que o milagre que a levou a ser reconhecida como Santa, aconteceu em Santos, no Brasil. Santa Bakhita deve sempre inspirar sentimentos de confiança na Providência, doçura para com todos e alegria em servir.
Por Alessandro Scherma Schurig
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