“Interroga a beleza da terra, interroga a beleza do mar, interroga a beleza do ar que se dilata e se difunde, interroga a beleza do céu… interroga a todas estas realidades. Todas respondem: ‘Vê, nós somos belas’. Sua beleza é uma proclamação. Estas belezas sujeitas a mudança, quem as fez senão a Suma Beleza, não sujeita à mudança?”[1]
Aberta a mão de Deus com a chave do amor surgiram as criaturas[2]. Deus, com efeito, criou o mundo por um livre desígnio de sua bondade e de seu amor, não para aumentar a sua glória, mas para manifestar e comunicar a sua beleza.
Contudo, como Santo Agostinho, poderíamos indagar: “O que é a beleza? O que nos atrai e afeiçoa às coisas que amamos?”[3]
Parece-nos que o melhor interpretador de Santo Agostinho é São Tomás, embora o Doutor Angélico não tenha elaborado comentários das obras do Doutor da Graça tal como ele fez com as obras de Aristóteles ou com as Sentenças de Pedro Lombardo. Portanto, para compreender melhor o que é a beleza recorremos à doutrina tomista.
I – Essência da beleza
A beleza designa aquilo que suscita no homem o sentimento de admiração. De acordo com São Tomás: “pulchra dicuntur quae visa placent” – “chama-se belo aquilo cuja vista agrada” (I, q. 5, a. 4, ad 1). Ouçamos o Doutor Angélico expor esta doutrina:
“Lo bello es lo mismo que el bien con la sola diferencia de razón. En efecto, siendo el bien lo que apetecen todas las cosas, es de la razón del bien que en él descanse el apetito; pero pertenece a la razón de lo bello que con su vista o conocimiento se aquiete el apetito. Por eso se refieren principalmente a lo bello aquellos sentidos que son más cognoscitivos, como la vista y el oído al servicio de la razón, pues hablamos de bellas vistas y bellos sonidos. En cambio, con respecto a los sensibles de los otros sentidos no empleamos el nombre de belleza, pues no decimos bellos sabores o bellos olores. Y así queda claro que la belleza añade al bien cierto orden a la facultad cognoscitiva, de manera que se llama bien a lo que agrada en absoluto al apetito, y bello a aquello cuya sola aprehensión agrada”.[4]
II – Elementos constitutivos e divisão
Três são os elementos constitutivos da beleza:
a) Primeiro, integridade ou perfeição (integritas), pois as coisas inacabadas, enquanto tal, são feias.
b) Também se requer a devida proporção ou harmonia (debita proportio).
c) Por último, se precisa a claridade e o esplendor, motivo pelo qual aquilo que tem cores claras e nítidas são chamadas belas (claritas).[5]
Dois são os gêneros de beleza: a física, que se refere à beleza do corpo, e a espiritual, que se refere à beleza da alma. “A beleza do corpo consiste em que o homem tenha os membros corporais bastante proporcionados, com um certo esplendor da cor conveniente. De igual modo, a beleza espiritual consiste em que a conduta do homem, isto é, suas ações, seja proporcionada segundo o esplendor espiritual da razão” [6].
III – A beleza na criação
Dispondo tudo com medida, número e peso (cf. Sb 11,20), estabeleceu “na obra de suas mãos” (Sl 18,2) uma variedade de graus segundo a natureza e a perfeição dos seres. Assim, da mesma forma como o efeito reflete a causa, nas criaturas irracionais encontram-se vestígios do Criador, de maneira que “as perfeições invisíveis de Deus, seu sempiterno poder e divindade, se tornam visíveis mediante suas obras” (Rom 1, 20). Por causa disto, se interrogássemos a todas estas criaturas, todas responderiam: “Vê, nós somos belas, porque somos reflexos visíveis da beleza infinita e invisível de nosso Criador”.
Mas, num grau acima esta o homem, que é a “única criatura na terra à qual Deus amou por si mesma”[7] e a “única capaz de conhecer e amar a seu Criador”.[8] Isto se deve a que no homem não encontramos somente vestígios de Deus, mas também a sua “imagem e semelhança” (Gen 1, 26). Com efeito, “ainda que em todas as criaturas exista alguma semelhança de Deus, só na criatura racional se encontra a semelhança de Deus como imagem”.[9] Por causa disto, se interrogássemos os homens, todos responderiam: “Vê, nós somos belos, e possuímos uma beleza incomparavelmente maior à das criaturas irracionais por sermos imagens da Suma Beleza. Porém, esta beleza em nós é passível de aumento ou diminuição, posto que a imagem de Deus na alma se possui enquanto é conduzida ou possa ser conduzida a Deus[10]; ou seja, nós somos belos na medida em que estejamos na graça de Deus e na medida em que a nossa conduta e nossas ações sejam proporcionadas segundo o esplendor espiritual da nossa razão”.
Pe. Rodrigo Solera Lacayo, EP
[1] Sem. 241,2.
[2] Cf. S. Tomás de A. sent. 2, prol : “Aperta manu clave amoris creaturæ prodierunt”.
[3] Confess. 4, 13, 20.
[4] I-II, q. 27, a. 1, ad 3.
[5] Cf. I, q. 39, a.8.
[6] II-II, q. 145, a. 2.
[7] Gaudium et Spes, 24,3.
[8] Gaudium et Spes, 12,4.
[9] I, q. 93, a. 6.
[10] Cf. I, q. 93, a. 8.
Parabéns! Muito Belo!